1.10.05

Pseudo tentativa de suicídio

Porque o sol nasce. A claridade me incomoda. Então abro os olhos e deixo o novo dia entrar pela janela. Como se não tivesse outra opção. Embora a tenha. A vida é como uma prova de múltipla escolha, com todas as alternativas pedindo para serem escolhidas. Então me debruço na janela escancarada e torço para que um vento forte me derrube. Pois a coragem de escolher outra alternativa ainda não é suficiente. Isso implica que eu deva espera-la chegar? Deito no chão do quarto. As paredes azuis já não são mais “tão legais”. E fico ali, analisando a rachadura no teto, esperando que algo pesado caia lá em cima e faça tudo desmoronar sobre meu corpo. A televisão na sala incomoda minha concentração na rachadura. Agora já não imagino toda a casa desabando sobre mim e nem meu corpo sendo derrubado pelo vento. Agora penso no sentido da música do filme. E medito sem meditar. Fecho os olhos e tento imaginar o que se passa no filme para terem escolhido aquela música como parte da trilha sonora. E só pode ser um filme de amor. Daqueles bem melosos, que nos fazem chorar de tanta inveja. “Como eu queria ser amada como aquela menina” e suspira. A visão da rachadura volta a predominar. Ainda imagino tudo caindo. Lá vem o vento me convidando a janela, posso senti-lo. Meu corpo é pesado demais para ser levado. Ainda posso ouvir a música na televisão da sala. Ainda consigo visualizar o tamanho da rachadura. Ainda consigo imaginar meu corpo no chão lá embaixo. Mas se eu cair não existirá mais a música, a inveja da mocinha do filme romântico, a rachadura no teto e nem o vento a me convidar. Então não faz o menor sentido. Sento na cama e espero anoitecer. Acomodo-me e viso dormir. Quem sabe o dia que invadirá meu quarto pela manhã me traga outras opções! Quem sabe eu nem acorde mais.